lundi, décembre 25, 2006

Leite e Biscoitos

Sua tenra idade, 6 anos, não lhe permitia ficar acordada até muito tarde. “Minha filha, vai dormir”, dizia sua mãe, ao que rapidamente respondia “sim, mamãezinha”, de forma emburrada, enquanto já subia as escadas.

Acontece que ela não conseguia dormir. Permanecia acordada, ali, deitada, mesmo depois de uma festa de natal extenuante. Fixava o olhar no teto enquanto imaginava como deveria ser o bom velhinho. Será que ele era tão gordinho como diziam? Tinha mesmo as bochechas rosadas? Como ele conseguia entregar todos aqueles presentes numa única noite? E Rudolph? Será que realmente seu nariz acendia, iluminando o caminho do trenó natalino? Ela não sabia, mas estava determinada a decidir.

Desceu as escadas, depois de certificar-se que seus pais estavam dormindo. Caminhou até a cozinha para pegar alguns biscoitos e um copo de leite. O seu plano era presentear aquele velho senhor que alegrava as crianças do mundo inteiro todos os natais, para que ele, sentindo-se a vontade, contasse-lhe todos os segredos que ela gostaria tanto de ouvir.

Colocou tudo na mesa e colocou-se a esperar. Olhava para a lareira, que, por motivos óbvios, estava apagada, enquanto andava impaciente de um lado para o outro da sala. Resolveu sentar-se perto da árvore de natal, certa que aquele seria o lugar mais óbvio de esperar o velho São Nicolau. Não conseguia parar de pensar no momento em que finalmente conheceria Papai Noel.

Antes que pudesse imaginar, suas pálpebras lhe pesaram, e logo se achava em sono profundo.

Na manhã seguinte, acordou antes que todos. Ficou muito chateada por não ter conseguido o seu intento engenhoso, até que olhou para o copo de leite e prato onde ela havia colocado os biscoitos. Ambos estavam vazios. Ela então esboçou um largo sorriso. O bom velhinho esteve lá.

Comédias de uma vida cada vez mais crédula e esperançosa.

dimanche, décembre 17, 2006

Luzes de Natal

As luzes de natal, que piscavam nas árvores como lindíssimos vaga-lumes a dançar pela noite, rodeavam-lhes por todos os lados. O som que pairava no ar parecia como o de 100 anjos cantando, todos louvando o criador em um belo coral em uníssono. A torre do relógio estava completamente iluminada, de forma impecável e bela, a iluminar-lhes como se não houvesse mais ninguém ali. Todas as janelas daquele antigo prédio tilintavam com o brilho provocado pelas pequenas lâmpadas coloridas.

Ele olhava para o rosto dela, que se encontrava pousado relaxadamente em seu ombro, encontrava-se iluminado belamente pela ocaso ainda jovem. Estavam ambos sentados, observando o tradicional coral natalino da Praça do Ferreira. Ela olhava o Papai Noel pendurado no relógio, que parecia estar a descer para entregar presentes a todos os que por ali passavam, e ele admirava o rosto dela. Ele observava como o vento lentamente despenteava os seus cabelos de uma forma faceira, e que ele amava tanto. Via a face angelical dela, iluminada de forma intermitente pelas luzes natalinas espalhadas pela praça.

Ela olhava o quão cuidadosamente tudo tinha sido preparado. Gostava tanto da perfeição, e a noite parecia estar muito ao seu gosto. Pensava o quanto ela gostava de ficar ali, sentada, com a cabeça pousada no ombro dele, enquanto fazia em sua cabeça perguntas que só o futuro poderia dizer.

Repentinamente os olhos dos dois cotejam lágrimas de alegria. Estavam tão felizes que seu sentimento corria por suas faces, que eram claras como a lua que estava a os iluminar. Fazia tempo que não experimentavam uma noite tão bonita e romântica quanto aquela. Definitivamente eles estavam perdidamente apaixonados, um pelo outro, e ambos pelo clima sublime do natal.

lundi, décembre 11, 2006

Um dia como outro qualquer

Seria um dia como outro qualquer, não fosse aquela festa toda.

Seria um dia como outro qualquer, não fosse a quantidade de gente conversando, fazendo acordos.

Seria um dia como outro qualquer, não fosse a presença do cheiro de Justiça no ar.

Seria um dia como outro qualquer. Seria, mas felizmente não foi.

Como temos algumas surpresas boas.

Comédias de uma vida que seria como outra qualquer, mas não é.

dimanche, décembre 03, 2006

Ânimo

Ele não tinha mais ânimo para fazer coisa alguma.

dimanche, novembre 26, 2006

Desculpas

Ela estava no terraço do apartamento, com um copo na mão, olhando para o horizonte numa noite fria e escura. O vento batia em seu rosto, fazendo seus cabelos esvoaçarem. As lágrimas escorriam de seu rosto. Ela nem podia imaginar que haviam discutido por um motivo tão bobo. O pior era que ela achava que estava errada, mas não conseguia pedir desculpas. Era simplesmente muito difícil pronunciar aquelas palavras.

dimanche, novembre 19, 2006

Conjecturas

Todos as noites, no meu caminho para casa, passo por uma janela e vejo algo que me chama atenção. Um moço jovem, alto, de cabelos negros, bem vestido, a dançar com uma senhora que tem idade suficiente para ser sua avó. Olho para o rosto dos dois, que reluzem de uma forma singular sob a luz do luar que entra pela pequena janela, e vejo uma felicidade pulsante daqueles semblantes, jovem, dele, e gasto pelo tempo, dela.

Todos os dias, ao ver essa cena, me coloco a pensar. Fico tentando achar uma explicação para tudo aquilo. Seria aquele jovem um neto daquela senhora, que todas as noites, como um bom rapaz, ia fazer companhia à sua avó? E, como um excepcional neto, sempre dança com ela, para fazê-la relembrar dos bons tempos de outrora. Talvez eles fossem amantes, coisa que não seria tão estranha no mundo em que vivemos hoje. Poderia também ser um voluntário, que todas as noites ia ali fazer sua caridade e dar bons momentos a uma velhinha solitária.

Todos esses pensamentos passam por minha cabeça humana, que, como tal, é ansiosa por uma explicação, por um motivo. No entanto, realista que sou, sei que muito provavelmente ficarei apenas nas suposições. Dificilmente saberei a verdade sobre aqueles dois, que, durante sua dança, com seus sorrisos e rostos que deixam transparecer infinita candura e cumplicidade, me cativam todas as noites. E eu, admirando aqueles dois no breve tempo de um sinal fechado, posso apenas continuar fazendo conjecturas.

dimanche, novembre 12, 2006

Secretária Eletrônica

Lá estava ela, sentada no sofá naquela madrugada do mês de dezembro, ouvindo o bolero que tocava em uma rádio antiga, segurando com uma mão um copo de conhaque com a outra, uma foto. Estava tão linda naquela imagem emoldurada, tão feliz, tão diferente.

Lembrava como eram bons aqueles anos dourados, que pareciam tão distantes. Pensava em quanto ainda o amava, e tentava lembrar porque haviam se separado. A única coisa que vinha à sua cabeça era a imensa tolice consubstanciada em brigas sem motivo algum.

Olhava fixamente para o telefone enquanto os pensamentos passeavam pesadamente por sua mente inebriada pelo álcool. As lágrimas teimavam em correr por aquele rosto desgastado pelas noites em claro e pela depressão.

Quando menos esperava já estava a fazer confissões íntimas à secretária eletrônica dele, como se ainda estivessem juntos. Talvez nutrisse a esperança de convencê-lo que ele ainda a amava, da mesma forma que o amor dela havia permanecido intacto depois de tanto tempo de separação. Naturalmente ela estava ciente da baixa possibilidade de conseguir, mas, diabos, por que não tentar?

Após gastar quase toda a fita, finalmente põe o telefone no gancho. Quase sem perceber, um sorriso mórbido desenhou-se em seu rosto. “E se ele já tiver um novo amor?” pensou.

Fitou mais uma vez o conhaque e a foto, que estavam colocados bem diante dela, na mesinha de centro que ela comprou com ele. Tudo aquilo não importava mais. Novamente uma lágrima teimosa molhou sua face.

Finalmente, levantou-se do sofá, indo até a geladeira para pegar aquela última barra de chocolate, que estava devidamente guardada, para não derreter. Deu a primeira mordida enquanto pensava “teus beijos nunca mais”.

dimanche, novembre 05, 2006

Turismo

Ele e sua namorada esperavam ansiosamente no lobby do hotel. Já fazia alguns minutos que eles tinham pedido que a recepcionista ligasse para o quarto 605 e avisasse que já estavam esperando. Ele estava visivelmente tenso. É que já fazia mais de 6 anos que ele não via a moça que estava hospedada naquele quarto. O casal, que aguardava ansiosamente, olhava apreensivo para o elevador. Os momentos passam de forma vagarosa, até que finalmente a porta se abre. Lá estava a irmã dele, junto com o namorado, saindo do elevador. Ela estava deslumbrante, cheirosa, sorridente, com os cabelos loiros presos, formando um belíssimo rabo de cavalo descendo-lhe levemente pelas costas. Era exatamente como ele lembrava. Abraçaram-se e, mais que de repente, todo o nervosismo se dissipou.

Saíram juntos os quatro, para conhecer a bela cidade de Fortaleza. O irmão levou a irmã aos pontos turísticos que mais gostava, na esperança que estes também se tornassem também os preferidos dela, e ela o ligasse a eles, para quando ouvisse falar de algum deles, lembrasse de seu rosto e do bom momento que passaram juntos, irmão e irmã, acompanhados de sua namorada e namorado.

Visitaram o Centro Cultural Dragão do Mar, passeando por entre as obras e deixando-se viajar no reino da imaginação proporcionada pela beleza do local.

Depois se dirigiram à Ponte dos Ingleses, ou Ponte Metálica, para os íntimos, local dos eternos namorados que vivem na Terra da Luz. Ali ele, o irmão, abraçou sua namorada, e percebeu que sua irmã igualmente era abraçada pelo seu namorado, pois que ambos os casais achavam-se rendidos à magia romântica da noite fortalezense, infinitamente aumentada pelo bater do mar nas rochas que se encontravam abaixo de seus pés.

Por ultimo, se encaminharam a um famoso restaurante da cidade, para degustarem pratos típicos da capital cearense. Estavam lá os quatro, sorrindo e se divertindo, com as conversas regadas à água de coco e refrigerante com limão, acompanhado de saborosa peixada.

Ao fim da noite, o casal anfitrião foi acompanhado pelo casal visitante até o local onde eles haviam deixado o carro. Ele, irmão, abraçou fortemente ela, irmã, e confidenciou-lhe que sentia muito sua falta, muito embora as peripécias do destino os tivessem separado em um passado distante, e que ela é uma pessoa importantíssima para ele. Abraçou-a fortemente, deixando transparecer que, embora ainda estivessem juntos, já sentia sua falta. Mais uma vez despediram-se, e seguiram seus caminhos, na esperança de poderem se encontrar novamente um dia.

Comédias de uma vida cada vez mais esperançosa.

dimanche, octobre 29, 2006

Engenhosidade

Muitos o chamavam de louco. “Voar é coisa pra pássaro”, diziam. “Deixa de loucura, rapaz”, falavam. Tentaram o desiludir, mas não conseguiram, pois ele era, antes de tudo, um brasileiro, e não desistia nunca.

Gastou anos perseguindo um sonho. Construiu diversos balões que encantaram a cidade luz, mas não era o suficiente, pois ele não podia ir para onde queria neles. Voltou à oficina e aos projetos.

Anos depois decolava seu primeiro balão dirigível, deixando a capital do mundo de boca aberta, mas não era o suficiente, pois não era um objeto mais pesado que o ar. Voltou à oficina e aos projetos.

Mais algum tempo se passou, e mais uma vez estava ele lá, tentando, pela 14ª vez, realizar seu sonho. Começava a acelerar. O vento corria pelo seu rosto de uma forma deliciosa. A velocidade aumentava, elevando também a adrenalina. O seu coração começava a levantar vôo, junto com sua máquina voadora. De repente lá estava ele, 2 metros do solo, sob os olhares de diversos parisienses que admiravam aquele homem que outrora fora chamado de louco. O mundo nunca mais foi o mesmo.

Uma singela homenagem à Alberto Santos Dumont, que em 23 de outubro de 1906 decolava na primeira maquina mais leve do que o ar a alçar vôo, o 14-Bis.

dimanche, octobre 22, 2006

Fazenda

- Amor, você não sabe o que houve. Os sem-terra invadiram a fazenda do meu pai.

- Interessante. Você sempre defendeu os sem-terra.

- Eu, defender aqueles vagabundos?

- É sim. Eu até te vi numa passeata do MST uma vez, na faculdade.

- É verdade... Mas é que agora é diferente.

- Diferente por quê?

- Porque é a fazenda do meu pai. É minha herança, não dos outros.

- Sei não, mas tou te achando muito nefelibata.

dimanche, octobre 15, 2006

Brinde

Os dois estavam sentados na cama, com as lágrimas rolando pelo rosto. Estavam tão tristes, decepcionados, desapontados.

Ela argumentava que a vida não fazia mais sentido. Ele dizia que ambos ainda tinham um ao outro. E como estavam deprimidos.

Depois de muito conversar, ele viu que só havia uma saída. Foi junto com ela à pequena loja na frente da casa deles. Dirigiu-se à sua mesa de trabalho, que era, por certo, a mais bonita que um boticário pobre poderia comprar. Pegou alguns frascos, misturou e serviu em duas taças. Os dois levantaram os copos e brindaram, saboreando posteriormente, como a um doce vinho.

Passado aquele macabro brinde, ambos se deitaram, abraçados, ela na frente, ele atrás, com as mãos entrelaçadas.

jeudi, octobre 05, 2006

Literário

Ele estava apreensivo. Fazia mais ou menos dois meses que tinha se inscrito num concurso literário da repartição onde trabalha, feito em homenagem a uma grande autora cearense. Ele havia escolhido um de seus melhores textos, intitulado "Ponto e Vírgula", adaptou e enviou à comissão avaliadora. Estava tão ansioso em participar que protocolou sua inscrição com o número 001, talvez no desejo de que "brevidade" fosse um dos quesitos a serem avaliados.

Os dois meses que separaram a data da inscrição e a divulgação do resultado foram particularmente longos. Aqueles minutos que antecediam o anuncio oficial do resultado, como não poderia deixar de ser, pareciam demorar anos para passar. Os ponteiros do relógio pareciam faceiramente preguiçosos, temerosos de dar mais um passo adiante.

Os olhos vidrados na tela do computador, por onde seria anunciado o resultado. Aperta o botão atualizar no Internet Explorer. Nada. Pressiona o botão F5, como se o computador fizesse alguma diferença entre o botão do teclado e o do navegador, que fazem rigorosamente a mesma coisa. Nada. Praguejou baixinho contra o sistema de informática. Nada.

Quando já havia desistido, a rádio do local de trabalho começa a anunciar os nomes. A tensão, local e arterial, começa a subir. Ouvidos atentos. 1º lugar. Nada. 2º lugar. Nada. 3º lugar. Nada. 4º lugar. Nada. Já havia perdido as esperanças quando ouve o seu nome ser falado pela locutora, como classificado em 5º. Uma sensação de alegria invade o seu peito. Não ganhou o computador ou os livros que ficaram reservados aos três primeiros colocados, mas a simples sensação de reconhecimento já era prêmio o bastante. Um sorriso profundo se desenhou em seu rosto e a felicidade invadiu seu peito. Ele também se tornou mais um blogueiro a deixar o ao nonimato da internet.

Comédias de uma vida longe de ser privada.

dimanche, octobre 01, 2006

Eleições

Lá estava ele, sentado no velho banco da praça. Lembrava-se de quando a conhecera ali mesmo, há tantos anos, num dia de eleições, como aquele. Ele já havia votado, quando ela sentou do seu lado e começou a conversar:

- Em quem você vai votar?
- Eu já votei.
- Em quem você votou?
- No Juscelino Kubitscheck.
- Eu não voto nele não. Perece muito idealista.

E naquele momento ambos se sorriram. Depois de algumas horas, ambos se levantaram e achavam que nunca mais iriam se encontrar.

Acontece que o destino o uniu outra vez, naquele mesmo banco, num outro dia de eleição.

- Olá.
- Oi! Quanto tempo ein?
- É verdade. Parece que você acertou na sua escolha não é? Juscelino foi eleito, e até que ta fazendo um bom governo.
- Verdade.

Mais uma vez se sorriram e conversaram a tarde inteira. Daquela vez, antes de se despedirem, marcaram de se encontrar uma outra vez, afinal, se o destino o fez se encontrarem por duas vezes, deveria ser porque reservava algo pros dois. Pouco tempo depois estavam namorando.

Outra eleição se aproximava, e eles marcaram de se encontrar, antes de irem votar, naquele mesmo banco em que se conheceram. Quando ela chegou, ele já estava lá, esperando. Conversaram um pouco quando ele, meio nervoso, colocou a mão no bolso, para tirar uma caixinha preta. Ajoelhou-se no cimento quente e ali mesmo a pediu em casamento, e ouviu o “sim”.

Antes de votar eles sempre se encontravam naquela praça, como que se fosse pela primeira vez. E como que se fosse a primeira vez, se enamoravam novamente.

Dessa forma muitas eleições se passaram, mas nessa o encontro não se repetiria. Ele fitava o horizonte, nutrindo uma falsa esperança, fonte de uma tolice inerente a alma de cada ser humano. “Ela já era muito idosa”, ele pensava. Uma lágrima escorria pelo seu rosto.

samedi, septembre 30, 2006

Novo Blog

Venho aqui anunciar que estou começando um novo blog, o Considerações Políticas. Quero avisar que continuarei aqui, todos os domingos, postando uma nova crônica, mas também postarei lá, uma vez por semana, e peço a vocês, amigos leitores, que acompanhem e comentem os dois.

Muito obrigado.

dimanche, septembre 24, 2006

"The Way You Look Tonight"

Fazia algumas semanas que eles decidiram comemorar seu quinto aniversário de namoro no café que fica próximo à escada vermelha do Dragão do Mar. De fato aquele ambiente era muito romântico, e foi escolhido a dedo. A iluminação era perfeita, a refeição, soberba, o amor, sublime.

Ele a olhava com paixão. Como ela estava linda sob aquela luz. A cor branca de sua roupa realçava as suas bochechas, que tinham um belíssimo tom de rosa. Como aqueles dois se amavam.

Ela o olhava, deixando o amor transbordar pelos seus olhos. Admirava a forma que ele a observava. Divertia-se com classe improvisada dele numa situação que ambos não estavam acostumados a viver.

De repente alguém lá embaixo liga o som de um carro, e a musica que toca não poderia ser mais oportuna. A voz de Rod invadia o ambiente. De fato, como Stewart falava, ele a amava “just the way you look tonight”. Enquanto ele cantarolava a música, um tanto desafinado, naturalmente, ela se sorria, com visível felicidade por aquele dia especial.

Depois partiram rumo à ponte dos ingleses. Embora aquela paisagem seja extremamente bonita, ele não conseguia tirar os olhos do rosto dela. Como ele gostava da forma que a lua iluminava seu sorriso. E ele sorria também, enquanto diversos versos de Tom Jobim vinham à sua mente. As vezes ele deixava que alguns lhe escapassem pelos lábios. Ela sorvia cada palavra com um prazer indizível.

As horas passaram rapidamente, mas eles permaneceram ali, abraçados, olhando para o horizonte, naquele momento o mundo todo como que havia parado com o único objetivo de observá-los. A ponte dos ingleses, lotada de pessoas, parecia vazia, como que tivesse sido feita apenas para aquele momento e para aquele casal. Eles permaneceram lá, daquele mesmo jeito, por muito tempo. E como se amavam.

dimanche, septembre 17, 2006

Paris

Paris era uma cidade tão linda, ainda mais naquela época do ano. Os flocos de neve descoloriam de forma cativante as ruas que dão acesso à famosa Torre Eiffel. Era uma das mais belas visões que alguém poderia ter.

Numa daquelas ruas havia um pequeno e charmoso bar parisiense. Num dos bancos do balcão sentava um homem, cuja tristeza não condizia com a alegria do local. Lá estava ele, sentado, olhando para a foto de uma mulher, enquanto balançava suavemente o copo cheio de conhaque.

Aquele senhor, que devia ter algo como 45 anos, tentava segurar as lágrimas que teimavam em rolar pelas suas faces brancas. Olhava para aquela foto, sem dizer uma só palavra. Seu olhar demonstrava a enorme desolação pela qual passava.

Estaria ele lamentando uma perda? Por acaso era sua esposa, que havia falecido? Ou fosse uma parente que há muito tempo não via? Não podia saber ao certo. Queria pergunta àquele homem o motivo de sua tristeza. Decidi não o fazer, pois não o queria o atrapalhar com o mero objetivo de saciar minha sádica curiosidade. Chamei o barman, e perguntei-lhe quem era aquele sujeito. Ele deu de ombros, dizendo que nunca o vira antes, e que já fazia umas três horas que ele estava lá, balançando aquele copo de conhaque e chorando silenciosamente.

Fiquei ali sentado tentando imaginar o que passava na cabeça daquele senhor. Pensava o que alguém tão triste faria naquele lugar tão alegre. Pensava como poderia alguém ficar tão deprimido numa cidade tão bonita. Pensava, apenas pensava.

De repente, ele cessa seu movimento quase hipnótico, toma o conhaque e sai, logo depois de pagar a conta.

Quase havia me esquecido daquele sujeito do bar quando, no dia seguinte, li o jornal. Lá estava a foto daquele senhor. Era um empresário bem sucedido, que havia acabado de ser deixado pela esposa. A policia afirmou que a única coisa que acharam junto ao corpo foi uma arma e a foto de uma mulher.

dimanche, septembre 10, 2006

Uma Flor

Era uma noite particularmente fria daquele ano de 1944 na pequena cidade de Birkenau, na Polônia. A lua, que costumava estar sempre bela, escondia-se por trás das cinzas que estavam em suspensão no ar, como que se estivesse envergonhada com o que presenciou por muitos anos em Auschiwtz.

Durante as últimas semanas as chaminés têm expelido muito mais fumaça que o normal. Isso era o reflexo do desespero de Berlim, que via o exército vermelho se aproximar cada vez mais.

Alguns soldados estavam conversando próximo da estação de trem, visivelmente preocupados com a derrota, que naquele momento, já era certa. Neste momento passam por eles várias mulheres judias, que estavam saindo diretamente da composição ferroviária para o “banho”. Todas elas tinham o cabelo raspado e as faces sujas. A maioria possuía a pele colada aos ossos, devido ao avançado estado de inanição. Aquelas judias já não refletiam mais a vida em seus olhos. Não pareciam mais com seres humanos, mas autômatos, totalmente desprovidas de vontade própria.

Depois da pequena caminhada, elas entraram na câmara, onde foram trancadas.

Desespero.

Gritos.

Silêncio.

Minutos depois os corpos daquelas mulheres eram atirados nas chamas dos fornos construídos especialmente para dar cabo à “Solução Final”. Novamente começava a fúnebre chuva de cinzas acompanhada do característico cheiro de carne e cabelo queimados. Aquela macabra precipitação já cobria todo o solo, que naquele momento tomava um lúgubre tom acinzalado.

Porém, no meio de todas aquelas cinzas, uma flor achou de brotar. Contrariando a lógica, aquela rosa cresceu e permaneceu ali, debilmente de pé. Desafiava as luzes dos postes de vigilância do campo, resistindo a todas as provações e colorindo com sua singela beleza aquele quadro tristemente monocromático. Lá estava ela, próxima das cercas elétricas, resistindo e corajosamente esperando que mãos dignas a viessem colher.

lundi, septembre 04, 2006

Enquanto Escrevo

Quando sento diante do meu bom e fiel celeron para escrever algumas linhas, o mundo ao meu redor parece parar. Fecho-me para o mundo real, para dedicar minha atenção apenas ao que escrevo. Mas a verdade é que o mundo não para. Muitas coisas acontecem enquanto estou aqui, conversando com as musas que rodeiam todos os escritores, mesmo aqueles que, como eu, são apenas amadores.

Neste exato momento, quem sabe, não esteja outra pessoa também escrevendo. Talvez alguém esteja lendo uma nova crônica do Airton Monte no jornal e sorrindo um pouco? Quiçá essa mesma pessoa esteja hoje se interessando pelo belíssimo mundo da escrita, e um dia se tornará também um cronista.

Neste mesmo momento um casal se conhece no calçadão da Praia do Futuro, sem saber que o destino de ambos estará enlaçado para o resto de suas vidas. Ao lado deste mesmo casal passa um senhor fazendo cooper a noite, lembrando como gostava de fazer isso com sua mulher, quando ela ainda estava viva.

Enquanto estou escrevendo, um homem solitário também está a produzir algumas linhas de um documento todo especial. Está escrevendo a última carta, na mesa de sua linda sala-de-apartamento-da-beira-mar, após ter descoberto da pior maneira possível que sua esposa de fato estava dormindo com Escobar, amigo seu de longa data, e que ele conhecera ainda na época de seminário, quando ambos pensavam em ser padres.

Agora mesmo um candidato passeia por entre o povo, se fazendo passar por um deles, conversando, convencendo, comprando.

Neste minuto um jovem reencontra sua namorada virtual, e com ela troca juras de amor, fotos, telefones, sem nunca saber que ela mora na porta ao lado, e que ambos poderiam encontrar pessoalmente seu amor verdadeiro, se apenas tivessem a coragem de dar seus endereços, sem ter medo de na verdade estarem falando com um seqüestrador que quer apenas conseguir dados para perpetrar uma ação delituosa.

Enquanto escrevo, o romântico está buscando sua amada, a imaginando, deitificando, adorando, se enamorando, antes mesmo de conhecê-la. E ela está lá, esperando, com uma flor na boca, pronta para ser colhida por ele, que a guardará consigo em seu peito, sem nunca ser ferido por sequer um dos espinhos.


Em homenagem ao grande escritor Airton Monte.

dimanche, août 27, 2006

Leitura

Caminhava por aqueles corredores lotados. Todos procuravam por um livro para comprar. Ele, no entanto, preferia observar as pessoas. Sentia uma felicidade imensa ao ver tanta gente, das mais diversas classes, buscando avidamente o universo da leitura. A satisfação enchia o seu peito.

Caminhava e via, de um lado, a pessoa mais simples vinda de um bairro pobre da capital, e do outro o Deputado Federal, acompanhado do Vice-Prefeito. Estavam todos dividindo aquele mesmo espaço, e buscavam a mesma coisa: deleitar-se com as palavras de algum escritor talentoso.

Caminhava e observava. Notou algumas crianças, sentadas no chão ouvindo histórias, e via ali o futuro do Brasil sendo construído. Nos olhos de cada criança via o brilho. Naquele exato momento os contadores de histórias despertavam nos pequenos o interesse pela cultura, escrita e leitura. Ele sabia que aquelas crianças estavam fadadas ao sucesso. Mais uma vez a felicidade inflou seu coração.

Caminhava e olhava as prateleiras, para ver se achava ele também um bom livro para tomar-lhe as horas do dia. Depois de tanto procurar, e de observar as pessoas, que brincavam e se divertiam com as páginas das obras literárias, achou o que queria. Voltou para casa com a certeza de que vira um dos fenômenos mais bonitos que poderia imaginar, e num local tão pouco provável. Tinha certeza de que ali vira o nascer do futuro da nação. E como estava feliz.

Comédias de uma vida cada vez mais literária.

dimanche, août 20, 2006

Brincando com os cabelos

Adorava a sensação de ter o corpo dela deitado sobre o seu, com aquela linda cabeça repousando sobre seus ombros. Brincava com seus dedos entre os cabelos dela. Sentia aquele perfume maravilhoso. Nunca se sentira tão feliz.

dimanche, août 13, 2006

Corações no Caderno

Ela estava de costas para ele. Seus cabelos negros pousavam formosamente sobre os ombros. Os seus cachos assemelhavam a pequenos pedaços do éden. Embora não pudesse ver, perdia-se imaginando aquele sorriso que já tinha vislumbrado diversas vezes. E como desejava que todos os sorrisos dela fossem só para ele.

O professor lhe chamava a atenção mais uma vez. Como podia ele se concentrar na aula, quando estava sentado bem atrás daquela menina que já era seu amor platônico há 6 meses? Será que o professor não podia entender aquilo? Ele só conseguia pensar nela, desde que acordava até a hora de dormir.

Olhou para a porta e lembrou-se como ela ficava linda ao entrar na sala, com o sol às suas costas, desenhando aquela belíssima silhueta, a fazendo brilhar como a de um anjo. A visão mais bela que alguém poderia ter.

E aquele perfume que ela usava? Parecia com jasmim combinado com tulipas. Por certo ele nunca sentira um cheiro tão agradável.

Não conseguia se concentrar na aula. O seu transe só foi quebrado quando o caderno dela caiu no chão, fazendo um barulho forte. Ele, como cavalheiro que era, apanhou-o e o entregou, mas não sem antes perceber algo que fez seu coração pular de alegria. Nas pontas das folhas haviam sido desenhados diversos corações, de todas as cores, com as inscrições dos nomes deles em cada um. Levantou a vista, entregou o caderno, tocando levemente os dedos de sua amada com os seus, sorrindo. Ela correspondeu o sorriso. Seu rosto era tão bonito.

Comédias de uma vida cada vez mais apaixonada.

dimanche, août 06, 2006

Lua de Mel

Estava sentado no quarto do hotel, admirando sua esposa. Haviam acabado de se casar, e fazer aquela viagem era um sonho antigo para ambos. Estava muit feliz.

Lembrou-se de quando a pediu em casamento. Recordou de quando escolheram o destino. Tinha na memória os minutos mágicos logo após a chegada deles àquela cidade. Era tudo mágico.

Olhava pela janela, admirando a beleza da cidade.

De repente, um barulho extranho invade o quarto. Parece uma sirene. Ele procurava por uma ambulância ou carro de polícia passando na rua, mas não viu nada. Quando levantou seus olhos, conseguiu divisar uma formação nebulosa peculiar. Parecia se prolongar no céu. Quando percebeu, era tarde demais. O seu hotel havia sido atingido por um míssil. Morreu ali mesmo, junto de sua esposa, no seu terceiro dia de casado. Os dois, como tantos outros, foram vítimas civis que passavam por Beirute.

Comédias de uma vida cada vez mais triste, em função da guerra.

dimanche, juillet 30, 2006

Culpa

c'est tout mon défaut

dimanche, juillet 23, 2006

Frustração

Ele tinha seu rosto coberto pelas mãos suadas. As lagrimas escorriam por entre seus dedos. A sua frustração era evidente.

dimanche, juillet 16, 2006

Receita de um amor inabalável

Pegue aquele olhar e junte com uma música de Roberto Carlos.

A isso acrescente várias estrelas, que devem polvilhar o céu de maneira maravilhosa. Adicione uma lua cheia, que deverá iluminar o casal.

Mecha a mistura até obter um pouco de paixão. A isso junte um belo sorriso dela e uma piscadela dele. Adicione beijos e abraços a gosto.

Depois disso, providencie uma troca de telefones. É importante também uma nova porção de encontros emocionantes.

Depois de trabalhar na massa durante algum tempo, lembre-se de peneirar, para tirar todos os sinais da mesmice e da rotina.

Junte-se um pouco de consciência, respeito, fidelidade e tolerância à mistura.

Depois de tudo isso, adicionem-se duas alianças, crianças e uma família feliz.

Esta é a receita de um amor inabalável.

dimanche, juillet 09, 2006

Vitória

Era uma noite clara, repleta de estrelas. A lua parecia iluminar a todos que ali, calmamente esperavam. Estavam todos ansiosos, esperando pelo resultado que demorava a sair.

A noite passava, a tensão aumentava, as unhas, roídas, diminuíam a ponto de começar a atingir os dedos. Aquela sensação, que lhes era tão familiar, estava especialmente forte.

Os ponteiros do relógio pareciam dançar, sem a mínima vontade de se mover, enquanto a angústia deles aumentava. Até que enfim, ouvem um ruído característico de uma porta se abrindo. Todos correm em direção àquele jovem de longos cabelos, como que leões a avançar para cima de sua presa indefesa.

Silencio.

O pequeno rapaz, do alto de seus 1,65m, mostrava uma face tão apreensiva quanto a dos outros. Levantou o papel em sua mão e leu em voz alta o resultado.

Silencio novamente.

Eles pareciam não acreditar no que ouviram. Uma forte emoção começava a borbulhar no sangue de cada um deles. Era a sensação de uma missão cumprida. Eles haviam conseguido. A alegria aflorava de seus rostos jovens e belos. Não se contiam em si mesmos. Pulavam, se abraçavam, corriam, gritavam. Sim, eles conseguiram, e de maneira majestosa. Conseguiram como poucos conseguiram antes. E comemoraram, certos de que aquele seria apenas o começo de grandes coisas por vir.

Comédias de uma vida cada vez mais vitoriosa.

dimanche, juillet 02, 2006

Analista

Aquele era um dia especialmente frio em seu consultório. Estava mais uma vez sentado em sua confortável cadeira, enquanto ouvia o que o seu paciênte tinha a dizer.

No início era agradável, mas com o tempo passou a odiar o que fazia. Talvez porque partilhava dos problemas de todos, e não tinha com quem partilhar os seus.

As vezes achava seus pacientes tão mesquinhos. Enquanto eles falavam, ele pensava "meu Deus, homem, arrume uma vida e larga logo do pé da tua mãe" ou "o mundo não gira em torno de você". Tinha vontade de externar seus sentimentos, mas sempre dizia para eles: "trabalhe mais nisso. Tudo vai ficar bem". Outras vezes divagava sobre a possibilidade de jantar fora com sua esposa, ou se tinha pago a conta de luz, só para ser interrompido por seu paciente chato, que queria se tratar. "Me deixa em paz", pensava.

Tudo o que ele queria era apenas usar do tratamento do "joelhaço". "Ah se eu fosse o Analista de Bajé".

dimanche, juin 25, 2006

Prólogo de Uma Vida Perfeita

Fechou os olhos. A musica do saxofone penetrava-lhe os ouvidos de forma extremamente suave e prazerosa. E como adorava o jazz.

Ao voltar à realidade, viu aquela mulher deslumbrante sentada a sua frente, trajando um vestido vermelho que reluzia em sua face clara. O rosto dela, afilado como uma pétala de rosa, trazia uma beleza indescritível. Suas mãos eram suaves como a seda chinesa que compunha a roupa que ela usava. Seus dedos eram finos como os de uma pianista. Sua boca era como um mar em que ele desejava se afogar. Sua beleza ficou ainda maior quando ela corou com aqueles olhares apaixonados lançados por ele. Como ele adorava quando ela corava. E ela não podia esconder um sorriso apaixonado que dançava lindamente sobre aqueles lábios delicados.

Haviam sido presenteados com a melhor mesa da casa. Ele havia combinado com o musico, amigo seu, para tocar as músicas mais românticas de seu repertório. Aquela noite seria especial.

Enquanto a admirava, pôs-se a lembrar da tarde daquele mesmo dia, quando estava na joalheria escolhendo o anel que iria lhe dar. Dentre todos, um chamou sua atenção. Sua delicadeza e beleza o faziam lembrar dela. Decidiu que aquele seria o que iria levar. Lembrava de seus encontros com ela, sempre românticos e apaixonantes. Lembrava do dia que se conheceram, quase por um passe de mágica. Lembrava de seu pretérito-mais-que-perfeito com ela e imaginava a vida a dois que estavam prestes a compartilhar.

Ela pareceu não ligar enquanto ele checava o bolso do paletó em busca do presente dela. Ele tirou a caixa de veludo ali mesmo, se ajoelhando e fazendo a pergunta que ela mais esperava. Sua face corou mais ainda, aumentando sua perfeição a níveis incalculáveis. Outra resposta não poderia dar senão o “sim”. Ele colocou o anel no dedo dela e a beijou como nunca havia feito antes, ao som do mais belo saxofone.

Comédias de uma vida perfeita.

dimanche, juin 18, 2006

Pôr-do-sol

Ele estava lá, admirando aquele belíssimo pôr-do-sol que só mostra sua real perfeição na Ponte dos Ingleses, em Fortaleza. Aquele tom de vermelho quase laranja colorindo o céu como uma verdadeira pintura de Monet, misturando-se com a cor dos verdes mares da praia de Iracema. Não podia pensar em alguma cena mais bonita em toda a sua vida. Estava tão absorto em sua observação que não percebeu que alguém estava ao seu lado direito, também admirando aquela imagem digna de uma aquarela.

Movido por uma intensa vontade e sem saber o real motivo, virou seu rosto o suficiente para perceber uma belíssima silhueta de uma mulher ruiva, branca, de estatura mediana, com o rosto afilado e tão familiar. Tinha reconhecido na hora a mulher por quem tinha sido apaixonado na sua infância e para a qual nunca teve coragem de contar o que sentia. Sempre admirou aquela beleza, que estava ali, parada ao seu lado, ainda perfeita, como ele lembrava, ressaltada por aquela obra divina que só pode ser visualizada num belíssimo fim de tarde na capital do estado do Ceará.

Finalmente tomou coragem e falou-lhe um envergonhado “oi”. Ficou tomado pela surpresa quando ela exclamou com muita felicidade em “olá” e abraçou-lhe fortemente. Sem que notasse, o perfume dos cabelos dela lhe encheu as narinas com um doce aroma de lírios brancos. Fechou os olhos, sem que ninguém percebesse, e lembrou-se de como adorava aquele cheiro.

Ficaram lá, observando o pôr-do-sol e conversando sobre tudo que tinha acontecido na vida de cada um desde que ambos pararam de se ver. O sorriso no rosto dos dois não negava a felicidade que cada um sentia.

As mãos dele começaram a ficar trêmulas. Finalmente havia decidido falar-lhe sobre sua paixão infantil, e que nunca havia contado pois achava que não tinha a menor chance com ela. As palavras fluíram de sua boca com uma imensa e impressionável facilidade, como se tivesse ensaiado por anos o que deveria falar. Ao ouvir o que ele tinha a lhe dizer, ela sorriu largamente, colheu-lhe as mãos e o beijou de como nunca beijara alguém antes, para depois por seus dedos no rosto dele e dizer que o amor dele era por ela correspondido. Contou-lhe que desenhava todos os dias no seu caderno um coração contendo o nome dos dois, e que o olhava durante a aula e suspirava. Ele apertou a mão dela mais uma vez e tocou os lábios dela com os seus, de uma forma que há muitos anos sonhara fazer.

Começaram a namorar naquele mesmo dia, e até hoje contam a quem quiser ouvir a sua história de amor.

Comédias de uma vida cada vez mais apaixonada.

dimanche, juin 11, 2006

Felicidade

Estava lá, sentado no sofá, olhando pela janela para uma noite escura, como que esta refletisse sua própria alma. O céu estava nublado, assim como seu coração. Não podia parar de pensar nela.

A imagem de sua esposa na semana anterior não saia de sua cabeça. Ele a tinha visto numa tórrida cena de amor com um vizinho. Impossibilitado de fazer algo, virou-se de costas e deixou o apartamento, sem que ela sequer notasse sua breve presença.

Todos os dias daquela semana ele voltava para casa, a encontrava e se punha a chorar. Ela, sem saber o motivo, procurava o encorajar. “Amor, resolva esse problema que o aflige” dizia ela, sem saber a causa daquele choro todo.

A família dele o levou algumas vezes para fazer compras, coroando a máxima da sociedade consumista em que viviam, em que todos devem ser felizes 24 horas por dia, sob pena de não serem perfeitos. E ele permanecia lá, em sua tristeza, querendo que o mundo entendesse que ele não queria estar alegre. Simplesmente não queria.

Foi por certo a semana mais difícil de sua vida. Pensava se a sua vida teria valido a pena. Pensava o que fez de errado no seu casamento. Pensava o que ela via no outro. Pensava. Pensava. Pensava.

Enquanto isto, a fumaça fazia um suave desenho ao sair do cano de seu revolver.

dimanche, juin 04, 2006

Ao Leitor

Raras são as vezes em que eu me reporto diretamente ao leitor. Esta é uma delas.

A maioria das vezes que me encontro aqui tentando escrever algo não tenho uma idéia fixa do que quero tratar, até que abro o editor de texto, me ponho a olhar àquela tela em branco e começo a namorar com o teclado e manter uma relação amorosa com as palavras. Outras vezes fico como hoje, a falar muito sobre coisa alguma.

Isso acontece porque todos os domingos, por volta desta mesma hora eu venho por aqui e escrevo algo. Fico a esperar algum comentário, que na maioria das vezes não vem. Naturalmente sei que isso não é sinônimo de desgosto por sua parte, leitor, já que tenho uma média de 7 a 8 acessos por dia, cada um com uma média de 2 minutos e meio de leitura.

Esse elevado número de leituras por dia, no entanto, me faz cumprir uma rotina quase religiosa de orar a Deus pela inspiração que muitas vezes não vem.

Mais uma vez me encontro a dissertar sobre coisa alguma. No entanto esse monte de “nada” que compartilho com meus leitores vale muito mais que muitos “alguma coisa” compartilhados com certas pessoas.

Comédias da vida de um escritor em busca de inspiração.

dimanche, mai 28, 2006

Vida Virtual

Conheceu aquela menina pela internet. Nunca achou que poderia se apaixonar assim. Trocaram telefones, se falaram por meses a fio, até que um dia quiseram se encontrar.

Chegado o momento, lá estava ele, sentado, aguardando. Quando olhou aquele sorriso, reconheceu imediatamente aquela mulher, mesmo sem nunca tê-la visto. Naquele momento ele se apaixonava por ela.

Nunca haviam se visto, mas parecia que se conheciam desde a infância. Ele a ouvia como ninguém. Ela parecia ser a única que lhe entendia. Beijaram-se naquele mesmo dia, sem que tivessem planejado nada. No outro dia eram namorados.

Os anos se passaram, e a paixão cresceu. Quando não se viam pessoalmente, encontravam-se pela rede. E seguiam sua paixão.

Um dia ele tomou coragem. A levou a um show de jazz de um amigo. Tornou aquela noite mais romântica que se podia imaginar. Ali mesmo tirou um anel belíssimo e fez a pergunta que mais esperava fazer, e ouviu a resposta que desejava ouvir. Alguns meses depois casavam-se sob o som do mesmo saxofone.

Ainda hoje vivem juntos, velhinhos, contando aos seus netos como se conheceram, de forma quase providencial, pela extinta rede de computadores chamada internet.

Comédias de uma vida cada vez mais virtual.

lundi, mai 22, 2006

Mais Uma Semana

Mais uma semana se passou. Entretanto não foi uma semana qualquer, mas uma que entraria para a história.

Durante todos aqueles dias ele era um dos que se sentava à mesa ao lado de grandes autoridades, frente a um palco composto por mais ou menos 450 pessoas.

Sentia-se recompensado por todo aquele tempo de trabalho, noites de sono perdidas, brigas travadas. Estava feliz, pois sabia que o trabalho dele e de seus colegas finalmente podia ser devidamente apreciado.

A semana passou rapidamente, mas deixou uma marca na sua alma e na de todos que a construíram, e foi um marco divisor de águas.

Como muitas outras, mais esta semana se passou, mas deixou uma contribuição indelével no ânimo de todos.

dimanche, mai 14, 2006

Sonho Realizado? (ou Crônicas de uma Vida de Policial)

O sonho da vida dele sempre foi ser policial. Via aqueles filmes Hollywoodianos, em que mocinhos sempre venciam os bandidos. Queria que o seu mundo fosse um pouco mais daquele jeito.

Quando atingiu a idade necessária, fez concurso para Soldado da Polícia Militar. Era a chance que ele tanto esperava. Fez a prova e passou com louvor. Naquele momento, atingia sua máxima realização pessoal.

Como um dia sonhara, combatia os criminosos, na tentativa de fazer sua cidade um local melhor de se viver. Cumpria suas missões com garbo e amor.

Certa véspera de dia das mães, estava indo ao shopping comprar um presente. Encontrava-se deveras ansioso para chegar na casa de sua genitora no dia seguinte. Era o seu primeiro dia das mães como policial. Estava quase chegando ao estacionamento do shopping quando foi abordado. Antes que pudesse dizer algo, sentiu algo como um ferro quente queimar-lhe a garganta. Sentiu a mesma coisa em seu estômago, e em seu peito. Eram balas que cravejavam seu frágil corpo. Uma facção criminosa de São Paulo estava comandando atentados terroristas, e ele foi mais vítima.

Jazia naquele carro o corpo de um filho amoroso, enquanto do outro lado sua mãe sentia um aperto no peito, sem saber o motivo.

Comédias de uma vida cada vez mais violenta.

dimanche, mai 07, 2006

Arrependimento

A água deslizava suavemente pelos seus longos cabelos negros, dispostos de forma displicente sobre aqueles seios fartos e macios. Estava debaixo daquele chuveiro há mais de uma hora. A noite tinha sido muito longa.

Poucas horas antes tinham se encontrado, ela e o seu namorado, num belíssimo restaurante da cidade. Parecia que seria uma noite excelente. Parecia, mas não foi. Ele teve mais um ataque de ciúmes violento. Ela, novamente, passou vergonha na frente de muita gente. Foi a gota d’água. Saiu imediatamente de lá, e deu tudo por acabado.

Pensava se a sua decisão tinha sido a mais correta, enquanto a água escorria pelo seu corpo escultural. Ouviu um barulho vindo da sua sala. “Deve ser aquele maldito gato”, pensou. Pouco tempo depois o ruído ficou mais alto.

Pegou a sua arma, a qual sempre tinha a seu lado, devido sua perigosa profissão, e foi em direção ao barulho. Viu um vulto se mexer em sua sala, e, sem pensar duas vezes, disparou.

Quando se recompôs, reconheceu o corpo estirado no chão, cravejado de balas. Era seu ex-namorado, que ainda tinha a chave da casa dela.

Cambaleante, ela caiu no chão, com as mãos cobrindo o seu rosto molhado pelas lágrimas. Quando olhou para o lado, notou perto do corpo dele um buquê de flores, com um pequeno cartão. Ao abri-lo, tornou a chorar. Tinha apenas 4 palavras, que nunca mais ela iria esquecer: “Te amo. Me perdoa?”

Baesado em um texto de Pedro Salgueiro.

lundi, mai 01, 2006

Uma Nova Forma de Contar a Vida

Hoje em dia a vida das pessoas está totalmente colocada em seus HD’s. Para saber a personalidade de alguém, basta dar uma pesquisada em seu disco rígido.

O leitor inveterado por certo tem diversos e-books na pasta “Meus Documentos”. Já o cinéfilo tem diversos filmes na sua lista de downloads. O idoso só tem o bom e velho “paciência” instalado. E o adolescente, diversas fotos de garotas em poses mais que sensuais.

Uma coisa, no entanto, todos têm em comum: o desespero ao ter que formatar o computador. Naturalmente nenhum deles se lembra de fazer backup, e acabam perdendo seus livros, filmes e jogos. Acabam sendo acometidos por algo que chamo carinhosamente de síndrome do HD vazio. Após a formatação, apenas sentam a vislumbrar seu disco rígido, sem nada a o preencher, com pouquíssimas pastas aparecendo no “Windows Explorer”, numa cena que chega a ser deprimente. Parecem ter uma parte de suas vidas tomada pelo vilão do vírus de computador. E ficam lá, sem saber o que fazer.

Comédias de uma vida de HD vazio.

dimanche, avril 23, 2006

Estupidez

Ele tinha acabado de se formar em medicina e achava-se de uma raça superior. Um tolo, certamente.

Certo dia bateu-lhe na porta uma senhora de idade, que sofria de asma. Deveria ter perguntado-lhe o que tinha. Deveria, mas não o fez. Na verdade, perguntou àquela pobre madame sobre seu plano de saúde. Ao ver que aquela mulher, que vivia de uma parca aposentadoria, não tinha como pagar pelo seu atendimento, simplesmente fechou a porta na sua cara.

Passaram-se alguns dias, até que outra pessoa lhe visitou. Desta vez não era um paciente, mas alguém do Conselho Regional de Medicina, que portava um documento. Depois de pegar uma cópia e dar sua contrafé, sentou-se e leu. A expressão de seu rosto mudava gradativamente de uma mórbida indiferença para uma vívida preocupação. Aquela senhora que o procurara encontrava-se morta. O marido dela havia relatado toda a história ao CRM e agora o médico que não honrara o juramento de Hipócrates corria o risco de perder a sua licença.

Aquele homem havia descido de seu pedestal e começara a chorar. Percebera a besteira que fizera. Percebera sua negligência tirara uma vida. Percebera vividamente que poderia inclusive ser preso por homicídio doloso. Percebera que sua vida acabara junto com a daquela senhora. Arrependeu-se, mas agora já era tarde demais.

Via seu rosto exibido na televisão por repórteres que não demonstravam nenhum dó. Seus colegas lhe viravam as costas no trabalho. No dia de seu julgamento, ninguém estava lá para torcer por ele. Quando ele foi condenado, ninguém chorou. Quando foi encarcerado, os presos o aguardavam, já conhecendo o caso por inteiro, e desejando o mal daquele homem.

Terminava assim, naquela cela de prisão, uma vida promissora, jogada fora por um acesso de boçalidade só comparado à sua tremenda estupidez.

dimanche, avril 16, 2006

Vazio

Faltava algo, mas não sabia o que era.

Havia sido criado por sua mãe e seu padrasto como filho único. O seu núcleo familiar parecia estar completo, mas não estava. Faltava alguma coisa, mas não sabia dizer o que era.

Aquele vazio lhe perseguiu até a adolescência. Quando tinha por volta de quinze anos conheceu seus irmãos, filhos de seu pai natural. Aquele contato de poucos minutos com eles pareceu-lhe preencher o vazio que sentira por tantos anos. Aproveitou aqueles poucos momentos como se pudessem suprir uma vida inteira. Não podiam.

Logo se afastaram novamente. Isso o incomodava demais. Mantinham ainda o contato pela internet e pelo telefone, mas isso não era o mesmo. Queria mais. Queria retomar o tempo perdido e ter seus irmãos perto de si. Infelizmente isto seria pedir demais.

Agora, toda vida que começa a aula de Direito de Família, a depressão bate a sua porta e toma seu coração.

dimanche, avril 09, 2006

Um Sonho Realizado

Entrava no carro naquele dia mágico. Um sonho antigo se realizava. Todo o caminho até seu destino parecia magicamente iluminado. Nunca reparara tanto na beleza de sua cidade.

Ao chegar, viu que muitos estavam como ele, sozinhos, eufóricos, e até um pouco assustados. Eles também realiaram um sonho que há muito tinham em suas vidas. Quase que instintivamente juntou-se a eles.

Pouco depois foi acompanhado por um que era mais antigo. Foi levado, junto aos seus novos colegas, a um outro local. Lá ouviu que deveria se orgulhar de seu feito. Deveria estar muito feliz por está lá. E realmente estava. Olhava para os lados, via rostos sendo pintados, e esperava que o seu também o fosse. Desejava há muito tempo passar por aquela experiência quase ritaulística. Quando aqueles dedos atingiram seu rosto, com a fria tinta guache, sentiu um calor imenso invadir seu corpo, deixando refletir a sua profunda felicidade. Havia conseguido.

Via ao lado aqueles que o acompanharão por muitos anos. Estava particularmente feliz. Tinha a excelente sensação de missão cumprida. Sabia do seu esforço, e agradecia por tudo ter valido a pena. E como valeu.

Uma singela homenagem aos novatos da Faculdade de Direito da UFC de 2006.

samedi, avril 01, 2006

A Triste Vida do Limite

Muitos dizem que a poesia pode ser encontrada somente nas belas palavras que compõem um poema ou uma música. Alguns expandem esse conceito de forma a abranger um quadro ou escultura. Poucos são os que se atrevem a dizer o que vou dizer agora. Também há poesia na matemática.

Os matemáticos de mentes limitadas procuram sempre explicar o inexplicável, procurando acabar com a poesia de sua ciência. Tentam “enchatificar” o floco de neve, o enchendo de equações na vã tentativa de explicar aquilo que não está lá para ser explicado, mas sim admirado.

No entanto, debaixo dessa máscara de aborrecimentos criada por cientistas sem criatividade se esconde um universo tão fascinante quanto o das palavras.

O Pi, por exemplo, ao não repetir nenhum de seus números, reflete com imensa maestria a própria alma humana, complicada, irregular, desconcertante, e o faz de forma muito mais eficiente que muitos poemas.

Já o limite, coitado, tenta eternamente ser um número que não ele mesmo, sem nunca conseguir. Sofre eternamente na busca de ser alguém que na verdade não é. O limite, assim como o ser humano, tem inveja, quer ser o outro, esquecendo de si mesmo e de suas qualidades.

O limite mais invejoso é tão arraigado em nossa cultura que nem o percebemos: o próprio número da besta. Antigamente, quando você queria dizer que um número era infinitamente próximo de outro (e essa é a definição de limite) você o repetia três vezes. Assim, quando João disse em Apocalipse que “aquele que tem entendimento, calcule o número da besta; porque é o número de um homem, e o seu número é seiscentos e sessenta e seis”, disse na verdade que o número da besta quer ser o número da perfeição divina, o sete, sem nunca obter sucesso na sua empreitada.

Existe ainda a história do romance entre as retas paralelas, que por um infortúnio do destino só poderão se encontrar no infinito. Mesmo com esse gigantesco empecilho para o seu amor, não conseguem se distanciar uma da outra, permanecendo juntas até que finalmente possam se encontrar.

Os números são repletos de poesia, e da mais alta qualidade. Nós é que devemos estar mais atentos.

Comédias de uma vida cada vez mais matemática.

dimanche, mars 26, 2006

O Garoto de Bauru

Um garoto, que era como muitos outros, olhava para o céu naquela bela noite de Bauru. Via as estrelas brilharem no céu e sonhava um dia chegar próximo a elas. Afinal, qual garoto nunca sonhou em ser piloto e astronauta?

Muitos anos depois entrou para a Academia da Força Aérea, formando-se com louvor. Tornou-se um dos melhores pilotos de teste da FAB. Para completar, graduou-se pelo ITA. Já havia atingido muito mais que muitos brasileiros sequer sonhavam.

Mas aquilo não era o suficiente. Não havia esquecido de seu sonho infantil.

Um dia, a chance apareceu. A NASA selecionava pilotos para se tornarem astronautas. E aquele menino de Bauru foi o escolhido.

As adversidades vieram. O programa espacial americano passou por diversos problemas. O sonho mais uma vez se afastava. Mas ele não esmoreceu. Afinal de contas, já tinha chegado tão longe. Não era possível acreditar que iria acabar daquela forma. E não acabou. Os russos começaram a lançar os pilotos extrangeiros na velha Soyuz. E ele pegou a chance, levando com ele todos os brasileiros.

Na madrugada desta quarta-feira ele irá cumprir o sonho de muitos. Um brasileiro poderá alcançar as estrelas.

Uma singela homenagem ao Tenente-Coronel Marcos Pontes, primeiro astronauta brasileiro, que entrará para a história no dia 29, às 23h30, levando o verde e amarelo do pavilhão nacional mais alto que qualquer brasileiro já levou, e cumprindo uma parte da canção do aviador que diz "as estrelas de noite subimos, para orar ao cruzeiro do sul" e outra que fala "pois que a pátria nos céus, no altar, sempre erguemos, de ânimo forte". TC Marcos Pontes, que o senhor seja o primeiro de muitos dos brasileiros que vão levantar nossa pátria aos céus e subir às estrelas para orar ao cruzeiro do sul.

mercredi, mars 22, 2006

Uma Nova Vida

Olhava tristemente para aquela caixa. Tudo que ele pode juntar durante vinte e oito anos de empresa estavam dentro dela. Era uma cena quase bucólica, aquele senhor de cabelos brancos admirando sua sala vazia.

Milhares de coisas iam e vinham na sua cabeça. Imaginava o que ia dizer à sua mulher quando chegasse em casa. Como iria olhar nos olhos de seus filhos e dizer que tudo que tinha ganho em tanto tempo de empresa cabia numa simples caixa de papelão? Não sabia o que fazer.

Como poderia ter sido? Como, depois de dedicar toda sua vida àquela firma, iria terminar assim, sem sequer um agradecimento? Não podia aceitar.

Veio de repente o ímpeto de subir à sala de seu chefe, que tinha metade da sua idade, e dizer o quanto aquele moleque era inútil e odiado no escritório. Chegou até a porta, torceu a maçaneta, mas acabou por desistir e perceber que aquilo não iria adiantar de nada.

Voltou-se para a janela de sua sala, que tinha uma bela vista para o mar. Abriu o vidro e sentiu a brisa nos seus cabelos grisalhos mais uma vez. Como sentiria falta daquele lugar. Nunca fizera outra coisa na vida, e os seus 55 anos por certo garantiriam que não fizesse mais algo no futuro.

Via-se perdido diante daquela surpresa que o atingira exatamente no dia do seu aniversário. Tinha vergonha de ir à sua casa e encontrar os amigos, que certamente o esperavam àquela hora.

Ponderava toda a sua vida, e aquela brisa parecia cada vez mais o atrair para uma viagem que não teria volta.

Não sabia o que fazer.

dimanche, mars 12, 2006

Educação

O cidadão cearense é mau educado por natureza.

As vezes tenho vergonha de agir educadamente em público. As pessoas me olham como se fosse um extraterrestre, com um olhar que só é comparável ao lançado quando me atrevo a ler na frente de desconhecidos.

Tenho o costume dar bom dia, boa tarde e boa noite ao motorista de ônibus e ao trocadorpara todos, desde o mais simples gari ao mais eminente desembargador. Na grande maioria das vezes recebo um olhar penetrante que parece querer me dizer que aquela minha atitude foi extremamente ofensiva. Diante desses olhares, baixo minha cabeça sentindo um pouco de vergonha por ter sido educado. "Que cara idiota, me dando bom dia" deve ser a frase que passa na cabeça de alguns. Ou talvez simplesmente estejam tão acostumados a falta de educação em geral que simplesmente ficam abismados quando alguém os cumprimenta.

Porém, de vez enquando algo nos causa uma boa surpresa. Esses dias andava no ônibus e o motorista me deu boa noite e até desejou um bom fim de semana pra mim. Enchi-me de orgulho e respondi-lhe o cumprimento, desejando um fim desemana igualmente agradável. A atitude daquele homem tão simples mostrou mais uma vez que o estereótipo as vezes está errado. Nunca fiquei tão feliz com o cumprimento de alguém. Quem sabe a nossa população ainda tenha jeito.

Comédias de uma vida cada vez mais educada.

lundi, mars 06, 2006

Mulheres

Apenas um dia para elas não é justo!

De que seria o mundo sem as mulheres? Como seria o mundo sem a alegria da mulher, sem seu bom gosto, sem sua beleza, sem sua graça, sem sua maestria, sem sua inteligência? Com certeza, mes amie, seria um mundo estéril, que não valeria a pena habitar.

Elas são o sol, são o luar, são o chão sob nossos pés. São tudo, afinal.

Nascemos de uma, a outra entregamos nosso coração. Por elas vivemos e morremos. De que seriam os homens se não fossem elas, as mulheres?

Uma singela homenagem deste humilde escritor as mulheres, que, embora tenham o sua data comemorada no próximo dia 8, merecem nossas homenagens de sol a sol.

vendredi, février 24, 2006

Uma pequena surpresa

Incrível como algumas coisas nos surpreendem.

Hoje, depois de mais um dia árduo de trabalho, voltava pra casa quando me deparo com uma cena ao mesmo tempo simples e supreendente. Sentada no ônibus estava uma menina pequena, com a farda do colégio, e, na mão, um livro que explicava em termos bastante simples o Estatuto da Criança e do Adloscente.

Aquilo me encheu subitamente de uma surpresa só igualável a minha alegria em presenciar aquilo. Uma criancinha que, por certo, recebera aquele livro no colégio, e se deleitava ao ler e aprender seus direito. Esata ela, alí, tão singela, fazendo, a seu modo, uma revolução. Uma revolução contra a ignorância, contra a cultura de que aquele que lê deve ser relegado ao ostracismo. Uma revolução contra aqueles que acham que conhecer seus direitos é coisa de CDF. Uma revolução.

Surpreendeu-me algo mais, que não esperava. Supreendeu-me a minha própria surpresa. Claro. Porque haveria eu de estar surpreso com alguém que lê, que procura conhecer seus direitos, em tão tenra idade. Surpeendi-me por ser isto algo tão incomum, mas o fato é que não deveria me surpreender. A verdade é que aquilo não deveria ser a exceção, mas a regra. E isso só me fez perceber o quanto aquela menininha, em sua revolução pessoal, era imensamente mais corajosa que eu mesmo. Ela ousava, como um dia ousei, e ainda hoje me atrevo a ousar, lêr e conhecer seus direitos. Leva ainda uma vantagem: começar a sua revolução em tão tenra idade.

Ao ver esse tipo de coisa, sinto meu ânimo renovado. O Brasil ainda tem esperança.

Comédias de uma vida renovada de esperanças.

dimanche, février 19, 2006

Resumo de uma Noite Perfeita

Era uma noite belíssima. Passaram o dia inteiro juntos, enamorados, esperando por aquela hora. Estavam deitados, os dois, olhando para a televisão, quando finalmente ele aparece, diante de uma multidão.

Uma voz extremamente agradável, acompanhada de guitarras que emitiam um som infinitamente belo. Eram os Stones, que tocavam no Brasil. O casal, que não podia assistir pessoalmente, acompanhava de longe. Ela olhava para aquele homem que encantava 2 milhões de pessoas, que agiam como uma só. Ele olhava para ela, que o encantava como ninguém. Sorriam um para o outro, ouvindo aquela música que seus olhos emitiam e se beijavam. Viam Mick Jagger pela TV, que parecia traduzir a felicidade deles em suas músicas.

Ela adormeceu. Ele, que ficou acordado até o fim, acompanhava um show todo especial. Olhava para aquela mulher adormecida em seu colo, e admirava seu rosto de anjo enquanto ouvia as guitarras de Keith Richards. E via o quanto estava profundamente apaixonado por ela, o quanto a amava. Ao fim do show, ela acordou, indo para seu quarto para dormir. Ele, por suas vez, foi ao quarto de hóspedes, pegou um excelente livro (dado por ela) e começou a ler, lembrando-se daquele show, que não sairá de sua mente durante o resto de sua vida.

Comédias de uma vida cada vez mais musical.

lundi, février 13, 2006

Desrespeito

Chegamos ao nível do total desrespeito.

Certa manhã, um jornalista de um país conhecido por não ter se envolvido em nenhum conflito no século 20 achou engraçado fazer caricaturas do profeta Maomé. Este jornalista trabalha na mesma empresa que faz algum tempo negou-se a publicar determinado desenho por achar que ofendia a fé cristã. Incongruente, não? tais coisas não entram na minha simples cabeça ocidental. Em resposta muçulmanos em todo o mundo queimam embaixadas.

Enquanto isto, aqui mesmo em Fortaleza, o absurdo continua. Uma chapa que concorre atualmente ao DCE-UFC, talvez inspirada naquele jornalista, achou engraçado fazer chacota da fé cristã. Quando confrontados, se retraem e dizem que aqueles que apontam este erro são de extrema direita. Não se pode mais expressar sua opinião sem passar por uma verdadeira polícia política levada por aqueles que se intitulam "donos da verdade".

Falta respeito pelas opiniões.

Falta respeito pelas religiões.

Falta respeito pelas diferenças.

Falta compreensão entre os diferentes.

Sobra animosidade.

Comédias de uma vida cada vez mais confusa com os "donos da verdade".

dimanche, février 05, 2006

Emprego

Não pode um brasileiro andar pelas ruas sem ser assediado com empregos?

Nós brasileiros passamos meses procurando por trabalho, sem sucesso. Um dia, incrivelmente, a oportunidade bate à porta, e nós aceitamos.

Até aí nada de estranho, se não ocorresse o que nos deixa mais triste: todos aqueles escritórios ou empresas onde nós deixamos nossos curriculos resolvem que querem nos contratar para começar a trabalhar dois dias depois. E nós negamos a todos eles.

Negamos a todos mas não conseguimos parar de imaginar se teria sido melhor a outra opção, se ganhariamos mais dinheiro ou teriamos mais sucesso no outro emprego. O pior é que essa sensação não vai embora com o tempo. Até que nós decidimos ter errado na nossa decisão e saimos do emprego que aceitamos, e passamos mais vários meses atrás de algum lugar para trabalhar...

Comédias de uma vida confusa.

PS: Sei que destoa um pouco do tema do blog mas, por favor, ajudem este escritor clicandor no anúncio logo acima deste post, ok?

dimanche, janvier 29, 2006

Tragédia

Tinha passado horas no bar, depois de ter recebido um telefonema trágico.

Uma loura escultural que há muito o vinha observando finalmente tomou coragem e o abordou no balcão:

- Olá. Está sozinho aqui?

Ele, parecendo conter o choro, apenas disse, com uma ríspidez que por certo a garota não merecia:

- Minha esposa, grávida de sete meses, faleceu há poucas horas. Sinceramente não estou a fim de conversar.

Dito isto, apenas levantou e se retirou do local. Embora estivesse completamente bêbado, entrou em seu carro e chegou são e salvo em seu apartamento. No caminho lembrava de cada detalhe do momento em que recebeu a maldita ligação. Procurava esquecer que justamente naquela manhã, dentre tantas outras manhãs, tinha brigado com sua esposa. Se ao menos pudesse dizer que a amava. Se ao menos soubesse o que ia acontecer...

Sua sala estava tão grande, seu quarto tão triste. Sentou-se na cama e colocou-se a observar a janela, tendo sua mente bêbada inundada por pensamentos que preferia não ter. A culpa o consumia. Achava que aquilo tudo tinha ocorrido por causa dele.

Lembrou-se de uma arma que seu tio o havia dado havia muitos anos, e que estava guardada na gaveta do criado-mudo. A pegou. Ela parecia estar carregada. A única coisa que pensava era "Te amo, amor. Te amo tanto".

dimanche, janvier 15, 2006

Pressa

Vivemos num mundo em que 24 horas não são mais suficientes. Temos tanto o que fazer que o dia não é mais o bastante. Já existem até bancos que funcionam 30 horas por dia. Estamos cada vez mais apressados e fazemos cada vez menos do que costumávamos fazer.

Foi-se o tempo em que conhecíamos todos os vizinhos. Hoje, se algum deles nos pára, dizemos logo “falo com você mais tarde, porque estou atrasado”. Não podemos perder um segundo sequer para dedicar a alguém, mesmo que isso signifique a diferença entre fazer com que o outro se sinta amado ou que o mesmo se coloque diante de uma janela imaginando se alguém se importa.

Foi-se o tempo em que admirar o pôr-do-sol não era perca de tempo. Hoje os casais, no auge de sua pressa, se comunicam apenas por telefone, se casam e apressadamente se separam, sem nunca ter gasto tempo admirando o fim da tarde juntos.

Foi-se o tempo... e o tempo se foi. Passamos pela vida sempre apressados, na ânsia de ter algo melhor, e esquecemos do mais importante: viver.

Comédias de uma vida apressada.

vendredi, janvier 13, 2006

Animais (I)racionais

O ser humano tem muito a aprender com os animais.

O que vale a pena mesmo num relacionamento é o respeito, o amor mútuo e a qualidade do tempo gasto um com o outro.

O bicho homem ainda tem muito a aprender com o ser albatroz.

Os albatrozes vivem com os mesmos parceiros durante toda sua vida, celebrando um casamento de dar inveja à qualquer ser humano.

O sr. e a sra. Albatroz se vêem apenas oito dias por ano, mas se dedicam um ao outro 24 horas por dia. O sr. e sra. Humano se vêem 365 dias por ano, mas, ao somar as horas que dispensam ao parceiro, não somam oito dias.

O sr. Albatroz ajuda a sra. Albatroz, pois não é machista, e reveza o trabalho de chocar os ovos. O sr. Humano chega em casa, senta no sofá, abre uma cerveja e espera que a sra. Humano o trate como um rei.

A família Albatroz não separa seu vínculo mesmo estando em pontos diametralmente opostos do globo. A família Humano encontra-se por vezes na mesma cidade, mas a distância afetiva entre eles extende-se do Sol a Plutão.

O sr. e a sra. Humano não são tolerantes um com o outro. Seus egos por vezes se degladiam ferozmente. O sr. e a sra. Alabatroz se importam apenas com o bem estar do parceiro, deixando as invejas de lado.

O sr. Alabatroz não se importa quando a sra. Albatroz trás mais alimento do que ele ao ninho. O sr. Humano sim.

Comédias da vida de um homem que procura cada vez mais se aproximar do albatroz.

jeudi, janvier 12, 2006

Nova Leitura

Um novo talento surge por entre o cenário de anônimos escritores. Mais um blog foi registrado.


É muito bom ter uma nova leitura, ainda mais quando é de qualidade tão grande. Suponho que este blog se tornará num futuro próximo minha maior influência literária. Trata-se do blog Coisas da Vida, redigido pela excelente escritora Bárbara. Assim como a Alencar, é uma pessoa de extrema inteligência, elegância, sensatez e simplicidade.


Introduzimos, dessa forma, mais uma futura escritora no nosso meio. Mais uma que, como todos nós, se torna uma conhecida anônima, e diversos momentos de felicidade.

mardi, janvier 10, 2006

Juri

Chegou na sua casa vitorioso. Seu cliente, um grande figurão da cidade, havia sido absolvido da acusação. Todos davam o caso como perdido, mas o seu talento o fez vencer. Foi muito bem pago pelo serviço, e fez por merecer. Na outra manhã seu nome estaria estampado no jornal. Devia estar feliz. Devia... mas não estava.

Lembrou-se de ter visto as fotos da cena do crime. A vitima, uma mulher, estava morta, no chão, com um tiro na cabeça. Havia também uma criança, com perfuração de bala na têmpora esquerda. Eram a única família do réu.

Lembrou-se de ler no laudo pericial que as digitais de seu cliente estavam na arma.

Lembrou-se de uma audiência anterior, onde uma testemunha chave deu seu depoimento. Mas nada do que ela falara era verdade. Tudo era forjado para obter um álibi, e ele sabia disso.

Lembrou-se de que há poucas horas sustentou no tribunal do juri a versão de seu cliente, sabendo que tudo não passava de uma grande mentira.

Lembrando de tudo isso percebeu o quanto sua consciência pesava. Vendera sua alma naquela tarde. Admirava a rua do alto de seu prédio. Deserta, vazia, como a vida daquele homem naquele instante. Não aguentou e despencou do alto de toda sua arrogância, atingindo o chão como que a uma pedra, abrindo mais um buraco no asfalto. Por certo ganhou a manchete jornalística que lhe fora prometida para a manhã seguinte.

lundi, janvier 09, 2006

Pequenas Coisas

São as pequenas coisas que fazem a vida valer a pena. Isso é fato.

Tantas pessoas acham que vão encontrar a felicidade na fama, no dinheiro, numa declaração de amor feita em um outdoor. Tolos como uma porta, só saberão que a verdadeira alegria não reside aí depois de penarem longos anos para conseguirem estes objetivos.

Não existe nada melhor que assistir um filme com quem nós amamos, ver a um pôr-do-sol acompanhado da pessoa certa ou ouvir um pouco de jazz com alguém especial. São coisas bastante simples e, entretanto, tão valiosas, quando se sabe o verdadeiro valor delas.

Para ser realmente valioso, deve-se ser pequeno. Uma pequena rosa, uma simples canção, um telefonema na hora adequeda, um luar como tantos outros, um beijo. Todas estas pequenas coisas podem valer mais do que milhões de dolares.

Comédias da vida, simples e repleta de pequenas coisas.