dimanche, avril 29, 2007

Fim

Agora, no término de sua vida, finalmente percebeu que não havia vivido.

lundi, avril 23, 2007

Ruas escuras da cidade

Seu coração palpitava de emoção, enquanto aguardava calmamente. Observava as pessoas que passavam.

Via um homem de meia idade passando apressado pela rua, olhando para o relógio.

Logo depois, um menino no seu skate.

Continuava aguardando pacientemente, até que ele a vê. Ela passava ali todo dia, jogando seu cabelo casualmente sem se aperceber de seu admirador.

Ele a espreita. Quando a oportunidade aperece, ele salta do matagal, a arrastanto consigo. Ela tenta gritar, mas uma mão lhe cobre a boca. Esperneia. Chora. Geme. Mas agora não tem mais forças para bater as pernas. A vida lhe deixa o corpo lentamente.

Ele, satisfeito, sai do matagal tranquilamente, como se nada houvesse acontecido. E, mais uma vez, se perde nas ruas escuras da cidade.

dimanche, avril 15, 2007

Na Beira do Rio

Ela estava tranquilamente sentada à margem do Rio Ceará, observando o movimento das águas, quando vê aproximar-se um barco desconhecido. Assustada, ela se levanta e corre, a buscar mais alguem para ficar com ela.

Uma rampa desce da embarcação. Em cima dela posa galante um homem branco, com uma roupa reluzente que era desconhecida pela india dos lábio de mel. Ela não pode deixar de ficar encantada com a imagem daquele homem, que mais lhe parecia um Deus.

Quando ele pisa na areia clara, ela chega-lhe perto, tocando-lhe os braços e o rosto, maravilhada. Ele, por sua vez maravilhado com a beleza dos cabelos negros da nativa, deixou-se tocar.

Ela sinalisou para que ele a seguisse, dando-lhe guarita e proteção. Ele, por óbvio, aceitou.

O tompe foi passando. A india aprendeu a língua do homem estrageiro, os seus modos, os seus gostos. Ele encantou-se pela doçura da nativa, pelo seu afinco e paixão.

Não demorou para que os dois se amassem loucamente. E desse amor entre Iracema e Martin, há 404, nasceu a cidade de Fortaleza. Da mistura do branco com o índio surgiu a cultura cearense. Da paixão entre eles, surgimos todos nós.

Fortaleza, parabéns por mais um aniversário.

Comédias de uma vida cada vez mais fortalezense.

dimanche, avril 08, 2007

O mar

Ela olhava atentamente o mar, como quem espera alguém que tarda a chegar. De fato ela gostava de ficar alí.

O mar não lhe cobrava nada.

O mar não se importava se ela tinha passado batom.

O mar não se sentia envergonhado se ela ganhasse mais do que ele.

O mar não virava de costas para dormir logo depois de tocar o corpo dela.

O mar não olhava com desejo outra mulher.

O mar não se importava se ela ganhasse alguns quilinhos a mais.

A única coisa que o mar lhe cobrava era que ela o visitasse de vez enquando, e o observasse calmamente, como ela fazia agora.

lundi, avril 02, 2007

Pela Janela do Carro

Tinha apenas 10 anos de idade. Era a primeira vez que andava no banco da frente do carro. Meus olhos brilhavam como uma estrela no céu. Maravilhado com um mundo que se abria de forma faceira para mim, olhava pela janela do carro.

Na minha rua, pude ver uma porção de senhoras sentadas numa calçada qualquer, conversando animadamente. Talvez estivessem falando sobre o novo ferrorama que tinha chegado na loja de brinquedos da cidade, ou sobre o quanto as crianças da rua, que jogavam bila logo ali, fazem barulho.

Olhava pela janela do carro, mas não era mais menino. Já era um adolescente. Agora via do lado de fora da janela casais felizes, desfilando de mãos dadas pela Praia de Iracema, andando por entre as poucas barracas que haviam por ali. Os via se beijando com paixão e tinha inveja.

Chegando no Mucuripe, observei casas bastante simples, de pescador. O horizonte era decorado pelas velas das jangadas, que voltavam do mar, trazendo peixes e saudades.

Pude ver os prédios crescerem, formando um paredão de concreto na orla. Agora já era um homem adulto.

Ao longe, enxergava uma mulher saindo de uma loja de noivas. Um sorriso largo desenhava-se em seu rosto. Talvez estivesse a pensar na vida de felicidades que a aguardava, ou apenas a lembrar de quando sua mão foi pedida em casamento.

Eu olhava pela janela e via um jovem casal de mãos dadas. Ela o olhava com uma ternura quase materna, enquanto ele acariciava a barriga dela, já grande, carregando o fruto do amor deles, e eu os via, através da janela do meu carro.

Já no parquinho, chamou-me a atenção a mãe que olhava o filho jogar bola com o pai. Os olhos dela transbordavam felicidade. Riu-se quando o pai caiu, derrubando junto a criança, para se abraçarem no chão.

Agora a noite já crescia pela janela do carro, e eu já era um velho senhor.

Num restaurante jantava uma família inteira. Avô, avó, pai, mãe e filhos conversavam acaloradamente. Talvez falassem sobre a neta da vizinha, que aos 20 anos já estava grávida, de novo. Talvez o assunto fosse o neto que, todo bobo, havia comprado um ramalhete de flores para que sua namorada, a primeira de toda a sua vida, o perdoasse pela primeira briga que tiveram. Ou quem sabe estivessem brigando com a menina, que teimava em não comer nada, embora os ossos nos seus ombros fossem cada vez mais evidentes.

Pouco depois do restaurante pude ver um casal de velhinhos sentados num banco na praia. Ela dormia com a cabeça no ombro dele, e ele enrolava os cabelos dela por entre os dedos, da mesma forma que faziam quando eram jovens.

A noite já ia alta. Sabia que meu passeio estava perto do fim. Lembrava de cada detalhe enquanto o motor começava a fraquejar, até que, por fim, ele parou, e eu não podia mais lembrar de nada.